20131226



Pés descalços.




O ar quente e doce do quarto,
como há muito não era,
como se abraçasse o inverno
para ele não ter frio.

Com pés gelados na cama: devia durar para sempre.
A fugaz transição do desconforto para o conforto, é o melhor.
E nem é preciso que alguém os aqueça.
Só o ar quente e doce do quarto.

20131119

'So can you understand
Why I want a daughter while I'm still young?
I wanna hold her hand
And show her some beauty
Before this damage is done


But if it's too much to ask, it's too much to ask
Then send me a son'


20131110

cidades invisíveis



encher de matéria o vazio
o espaço que criei de raiz
em que, sem regar, 
cresceram cidades invisíveis.
sem vida na margem dos rios
sem longos passeios à beira mar
com pessoas que nunca vi
e famílias desencontradas,
amores platónicos,
e olhos a viver no espaço sideral, 
e eu, 
sem saber se existo, 
porque nem me vejo. 



20131006

dá-me fruta verde.

esse travo a novidade 
já não me arrepia a boca .

e se gostar do doce
fez de mim o mel
então que seja crua
e deselegante,
e fique guardada no pote empoeirado. 






20130723

home

                                                                 I was missing home.

Dança da chuva






Sonhos feitos à chuva ou então, maõs dadas no fim de uma tarde quente, com céu cor de rosa. Com tão mais amor. Não amei nos outros dias, nos dias em que parece que vai chover, ou nos dias em que a trovoada nos aguarda desprevenidos para rebentar, ou naqueles dias em que o sol luta para sair da sombra. Esses dias não são suficientes para que a auréola inebriante do amor nos envolva. Um par de olhos, sozinhos, são suficientes para contemplar um entardecer igual a tantos outros. Sei olhar as nuvens, sei-o desde pequena. Mas perco-me nos passos se danço à chuva sozinha. É preciso amor. Preciso do meu amor. Que situação ridícula desejar a chuva numa noite de verão e, mesmo assim, tanto a queria.

20130528

"Se o vento não mudar
Vou dar até sentir
Que há uma razão
Para crer que é bem melhor existir
Eu sei
Não vejo a luz em mim
Tão pouco em mais alguém
Só quis tocar o céu
Não quero mal a ninguém
Eu sei
Diz-te a canção do medo
Vê-se um dia o tempo não vos traz
Mas perde a noção do tempo
Quando eu amo é sempre devagar"

volta Manel 

Luz aos cegos.


O primeiro passo em direcção à fertilidade
é dar os olhos à luz
e fazê-la cegar a beleza do mundo.

Assim, na eternidade,
que todos os dias amanhece,
pode o cego acordar descansado
que não vai ver a água escorrer
nem vai ver o vento a desaparecer
nem o fruto a cair
nem o seu amor a partir.


20130418

Les amours imaginaires




há chuva.

a pradaria da utopia

Deixei a relva em que me regozijava à procura do prado do qual nunca vou voltar.
colho as flores e meto-as ao peito para que me tirem da paranóia que sou o mel.

Sou a fome e não o alimento.

20130407

Deste ao velho a chave de casa e ele ocupou-a com toda a sua velhice, com toda a sua desgraça e caduquice.
Arrasto estes pés há anos, isso e este mau cheiro de quem já passou da validade. Corta os pés. Então e o cheiro? Esse só seca com as palavras que não disseres.

20130327

Where is my mind?



Se é ao de leve que me tocas, cidade eu não pertenço a ti, nem a condição nenhuma. O jejum enfraquece-me os ossos que colapsam com os suspiros. De que me serve o amor, quando se estendem braços do chão e me prendem os pés. Se a minha vontade é descalçar-me deles, tu oh cidade, rasgas-me a carne e eu cuspo-te no chão. Não, não vou contigo. Não vou mergulhar na tua luz fria.

20130220

Faço a ronda matinal à tua volta,
vejo-te envolto em papel de pedra,
e tudo o que quero é atirar-te ao rio.
Mas tu flutuas.

20130115

Irresponsabilidade meditada
sabe a água salgada
e feridas nos pés
de pisar o risco.


Eu dei as mãos a pensar em cada dedo que te ia roubar.
Não me servem os anéis a mim.